quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Sorte

Por favor, ouça-me com atenção:
Não é o trigo que a sorte colhe
E nem sorriso que reveste o pão,
Mas é o de-cada-dia que alimenta a audácia
De cavar a alegria de não desistir em vão.
A sorte, inquieta,
Brinca de esconde com a razão
E permite que a trilha lodosa
Seja afastada da imaginação.
Porém, é do espinho que brota a rosa
Que fecunda sozinha no ardor do sertão,
Fazendo daquele que repeliu a dureza,
Caçador de beleza na escuridão.
E do incerto
Que se lhe atira o tiro,
Sofre sozinho sem saber então,
Que a sorte nunca colhe o trigo
Que provém audácia pr'além do sertão.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Declaração de amor

Sorri pra mim o teu sorriso mais singelo e me faz sentir o prazer afável das suas palavras em recordações tão doces.

Seu amor é semente que brota oculta dentro do meu peito e se traduz no desabrochar dos meus sorrisos.

Modulo meu castelo de areia, morada dos nossos corações alados, onde onda nenhuma é capaz de apagar, nem reveses, nem os sopros intempestuosos da vida.

Canto pra você ao deleite da dança das cordas, numa bossa de ninar pra te permitir cair de mansinho nos meus abraços.

Penteio seus cabelos com os dedos e acaricio cada bocado de alegria que os anjos concretizaram na sua face.

Te beijo, te amando com todo o meu eu, seu, mistura de nós dois.

E no presente, futuro nosso, escrevivo nossa mais linda canção, emoldurando nos ponteiros da vida, a mais sincera declaração de amor.




domingo, 23 de agosto de 2009

Boneca

Talvez eu tenha síndrome de boneca ou simplesmente a beleza pueril me cai melhor nas vestes.
Ou não.
Talvez eu seja uma boneca.
Uma boneca que arde em si pensamentos além do pano e se
mostra nos olhos de outrem como uma menina feliz.
Uma boneca que sorri encantada com as gentes que se alegram demais.
Uma boneca que tem o coração maior que o sonho e o sonho em vão, perante os ares.
Uma boneca que brinca sozinha e se diverte com os próprios gestos,
detalhes.
Que se consola com o próprio afago de sua mão.
Uma boneca que tem cheiro, gosto e fome de gente.
Sim, sou uma boneca de gente.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

De volta

Duvidei por muitas vezes que havia além de mim um manto de luz e amor com um Pai celeste. Duvidei que pudesse uma voz calorosa e mansa acalmar meus ânimos e sufocar minha dor. Duvidei que uma força inexplicável ultrapassasse os limites do real e modelasse o meu íntimo. Duvidei, Senhor.
Duvidei.
Contudo, hoje, com a mesma ousadia que me atirava no abismo, me deixo envolver pelas asas do seu espírito e ofereço minha vida em suas mãos.
Sou a ovelha desgarrada e o filho pródigo que volta arrependido ao pai.
Sou o seu milagre de amor e glória.
Sou sua filha, sua serva e fruto da sua salvação.
Obrigada por me receber de volta à casa.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Eu não queria um coração

Eu não queria um coração, às vezes
Que bate e sorri apertado quando a felicidade dura veementemente breve
E continuasse em melopéias freqüentes horas a fio
Suscitando lembranças com cheiro, com gosto de gente
Eu não queria um coração que transborda calado
Que se restringe e se limita a prazeres tão meus
E se deixa, à noite sozinho, valsiar a balada de adeus
Eu não queria um coração que pede carinho
Que sente a ausência de uma contra-parte
E chora seco, sem maldade, de fininho
Eu só queria um coração que lustrasse de vinho
Que anuviasse meu penoso destino
Tão parco, tão lúgubre, tão turvo e sem tino.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Antítese

Eu sinto na pele a bonança incrível das crianças
E os sorrisos tolos de afagos abraços dos cachorros que me amam na rua
Bebo a estripulia matutina do sol que colore de tom claro os meus lençóis vermelhos
E brinco com as gotinhas que dançam virtuosas no meu banho de chuveiro
Mastigo a doçura das risadas dos meus amigos
E sorrio quando, por ventura, uma lágrima respinga e padece na ponta do nariz
Estravaso os limites da loucura quando o que mais quero é ficar em silêncio
E falo tão pouco e tão breve quando a minha vontade é fazer o que não fiz
Não tenho pressa das coisas que vêm
E nem me doem as que passam demais
Alimento-me das pequenas carícias que a vida me fez
E me transbordo das grandes alegrias que ela me faz

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Já estava em tempo de acontecer e dessa vez você foi de vez em bora. Enfim arregaçou a calça, limpou a sola do sapato e partiu sem ouvir o meu adeus. Não daria certo nunca. Nunca seremos mais do que um casal que não deu certo e que revive sempre o mesmo passado amargo que atroz vivemos. Estava e sempre esteve claro aos meus olhos. Você que sempre negou o óbvio. Agora você parte num pedaço da estrada sem curva. Cortou simplesmente o meio da linha reta e sem assunto, foi e só. Não era assim que eu imaginava que tudo acabaria um dia. Não foi assim que eu quis pra mim, pra você e pra nós. O que resta é um vazio de saudade e angústia, mas um dia passa... Sempre passa.

sábado, 6 de junho de 2009

Anjo

Mais uma vez estive ali, num passo do abismo. Um pé pra fora e outro cambaleando. Lágrimas formando correntes pesadas puxando meu corpo pra distante do chão firme. Até, que não mais que de repente, surge uma mão- cálida, zelosa, forte -, me segura pelo braço, suspende, me livra do peso e pinta um sorriso no meu rosto. Um anjo... Um anjo sem asas, mas de pele, ossos, músculos e o que mais for necessário para um semblante humano perfeito. Perfeito na voz. Perfeito nos gestos. Perfeito, e só. Não há descrição aos pés desse meu anjo-protetor. Talvez, e muito provavelmente, porque o que há de maravilhoso alça vôos e as palavras perderam-se, como gotas sublimadas, nos ares. Um céu... O mesmo céu que parecia coberto de breu, ficou claro, límpido e breve. Ali, tão palpável às minhas pequenas mãos calejadas de tanto segurar o pranto. Tão perto. Reavi a cor do lume pra depois conseguir, novamente, almejar o paraíso. De tão baixo, à tão longe, longe, longe... Banhado pela estelar imensidão azul. Esperança: novamente encharcou meu peito de fantasia e agouro. Suspiro. Alívio. Mansidão calorosa a um coração cansado.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Perdido da vereda

Decisivamente, a vida é uma criança moleca que - cada dia que passa - nos impressiona com estripulias diversas. Quando eu menos imaginava (e queria) que o coração começasse a bater mais depressa, essa criança brinca comigo. Remexeu e balançou meus pensamentos e agora sinto que borboletas dançam dentro do meu estômago. Onde você estava esse tempo todo que eu não te via? A que passo do caminho você cruzou que eu não te ouvi? Tudo o que eu precisava transborda de calor e alegria a minha face e você que reviveu um eu perdido na vereda. Estava te esperando há muito e só eu não sabia.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Baca

A estrela maior já se despedia e sua esposa bailava triunfantemente no negror do céu. Passava das sete da noite e já era hora do ritual de caça. Era alva, sua pele, e dourado o tom das sua madeixas onduladas que pendiam até meio palmo da cintura. Tinha cerca de 25 anos e uma silhueta de causar arrepios. Tirou da bolsa, fiel escudeira, seu vestido rubro-sangue e sua sandália marfim. Arrumou-se, ajeitou-se. Pôs a meia de seda para adornar ainda mais suas pernas e coxas firmes e arredondadas. Maquiou-se: maçãs faciais rosadas e angelicais, um olhar negro-gato e os lábios vermelhos-fel. O relógio batia oito horas e estava atrasada, não podia perder mais tempo ali. Saiu do quartinho que alugara em Copacabana, somente para os fins de semana, e partiu - em passos largos - para a Av. Atlântica.
Estava bela, repugnamente bela e sabia disso. Fazia do asfalto a sua passarela e jogava os cabelos da maneira que só ela conhecia. Olhava os carros apressados e escolhia, minunsiosamente, a presa do dia. Até, que a 20 minutos de espera, surge um Siena da cor do seu traje e era aquele que queria. Lançou seu olhar palaciano de mulher que ali não vivia e ficou à espreita. O carro diminuiu a velocidade e veio em sua direção.
O motorista, um homem alto, robusto, de seus 30 anos de idade e um olhar azul marinho que a deixou fascinada, além da sua pele morena, mulata, sua cor preferida, abaixou o vidro e, levantando os óculos, dizendo: - Afim de algo diferente hoje?
A mulher de vermelho respondeu: - Faz-me o favor de abrir a porta primeiro.
O motorista achou aquele tom esquisito e o pedido ainda mais, mas com um torcer de lábios e um quebrar de pescoço, abriu a porta para ela entrar.
Em seguida, ele perguntou: - Pra onde vamos?
Ela respondeu: - À minha casa.
Novamente pareceu estranho a resposta ao motorista, mas era sexta-feira e ele acabara de terminar um noivado. Estava carente e enlouquecidamente bêbado; não iria, de forma alguma, perder tempo com suposições tolas e então, perguntou: - Onde é que fica?
- Eu te guio, disse ela.
E foram.
- Esse é o prédio, apontou. Ficava na esquina da Barata Ribeiro com a Siqueira Campos. Entraram.
Ela pediu que lhe esperasse no quarto e, se dirigindo até ele, o motorista tratou de despir-se para agilizar o processo.
Até que ela volta, ramo de videiras nos cabelos, corpo coberto de uma manta que se confundia com sua pele e tirso na mão.
Intrigado, o motorista pergunta: - O que é isso?
- Uma nova brincadeira, não se preocupe - ela dizia.
Amarrou-o na cama e, de repente, como uma leoa, estilhaçou primeiro a couraça humana e começou a comer a carne crua com as mãos. Estava, enfim, saciada.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Preguiça

São 9 da manhã de uma segunda chumbenta e Zeus brinca de inundar a cidade do Rio. De tom gélido e opaco, a cidade perde o codinome de maravilhosa. A chuva propenda o ócio e a vontade incontrolável de não se levantar da cama, tão quente, macia e gostosa. Desisto dos afazeres rotineiros e me acomodo, sem relutar muito, à preguiça. Levanto, me aqueço com um café ao leite, faço um carinho no bichano e retorno ao leito. Desenrolo a capa da vadiagem e me cubro por inteira. Não sei quem Morpheu mais acolhe, se a tua serva aqui (eterna) ou a pseudo-lince que se estira pelo lençol, ocupando mais do que o seu devido espaço. Fico pensando se devo me despertar e dar cor à vida. Respiro e penso, pensando e respirando e não chegando à conclusão alguma, além de que está quentinha a posição que me encontro. Imagino a faculdade, as pessoas que sentem frio agora, a fome, o desprender das barrancas, os casais enamorados... Não, me perdoe, mas a comoção ainda não se tornou maior que a coberta da minha cama.

domingo, 31 de maio de 2009

A arte de fazer versos

Escrevivo, em cada palavra, um resquício íntimo de vida.
E vivendo em si, em cada letra, sonho histórias de áurea fantasia.
Crio, recrio e brinco com todas as sílabas.
Repetindo, repetindo, travando e descobrindo a língua.
Recupero, em cada uma, o seu interior dispercebido e além de terminologias, faço sorrir pingos, pontos e vírgulas.
Trago da dor, que me consome inteiro, tinta que escrevinha dores.
Porque a dor só existe enquanto onírica pulsão de refletir versos, exposição de meus intrínsicos amores.

sábado, 30 de maio de 2009

Cópula de Baca com Ofélia

Hoje, eu acordei assim: cópula de Baca com Ofélia. Alucinada em sair pelas ruas, cortando gargantas, ao mesmo tempo que me deixo esvair na fonte de lágrimas que me embaça os olhos. É... Definitivamente, não acordei pro mundo hoje. Não acordei com o deleite de dizer "bom dia" e, muito menos, de admirar a paisagem que está a minha volta. Admito que me apetece o desespero. Admito ainda que é quase um salivar de chocolate. A loucura é infinitamente bela. Entre choros e suspiros, me pego sorrindo; às vezes, sem nenhuma razão aparente. E não é simplesmente porque sou infeliz. Infelicidade, sem dúvidas, é uma questão de prefixo, mas carrego nas costas - hoje - uma cruz de marfim. Fico me imaginando dilacerando-o. Ele, o homem que me tira o sono. Como eu sentiria prazer em vê-lo sofrendo, humilhado, pedindo comiseração com seus olhos suados e sua boca num púrpura pálido. Como me dói essa escravidão que me subestima. Escrava sim, essa é a palavra exata. Sou escrava desse amor sem limites e sem piedade. E como ele se sente repleto. Vê-se na sua entoação cínica e desdenhosa. Mas não, eu não tenho coragem. Meu lado Ofélia toma as rédias e não permite que eu o confraja em carne moída e continuo o dia no leito do rio, no fundo das águas...